Eleitor do Futuro vai à Funase e faz história
Referência nacional, programa é realizado para cerca de 300 socioeducandos no Cabo de Santo Agostinho

O ambiente é tenso, não dá para negar. Há uma atmosfera de ansiedade no pátio onde cerca de 300 socioeducandos da Fundação de Atendimento Socioeducativo (Funase) esperam, comportados e em silêncio, o começo do evento promovido pelo Tribunal Regional Eleitoral (TRE-PE).
Às 9h50 da ensolarada manhã da última quinta-feira (22/11), o coordenador da Escola Judiciária Eleitoral (EJE), Eduardo Japiassú, dá início ao Eleitor do Futuro - Exemplos de Superação, programa de referência nacional do TRE de Pernambuco. Normalmente, o programa acontece em clima de festa, em escolas públicas e privadas para crianças e adolescentes entusiasmados e expansivos.
Naquela manhã, o Eleitor do Futuro aconteceu no Centro de Atendimento Socioeducativo (Case) do Cabo de Santo Agostinho, uma das unidades da Funase. Foi dirigido a jovens de 17 a 21 anos que estão privados da liberdade por terem cometido atos infracionais.
Eduardo Japiassú cumprimenta a todos, lembra que a EJE promoveu em várias unidades da Funase eventos para mostrar a importância da democracia e cidadania, destaca que o TRE fez uma operação especial para emitir títulos eleitorais para os socioeducandos e os estimulou a votar. Quase 400 votaram em outubro. Dito isso, chama ao microfone o presidente do Tribunal, Luiz Carlos Figueirêdo, desembargador cuja história profissional sempre esteve ligada à defesa de crianças e adolescentes.
Ele conta rapidamente sua trajetória de vida e faz questão de corrigir uma expressão para aliviar o peso nos ombros daqueles que o ouvem atenciosamente. "Não existe menor infrator. Existem, sim, menores que cometeram atos infracionais". E complementa: "Somos seres humanos e precisamos acreditar na humanidade. O Estado precisa ajudar vocês para que todos saiam daqui como pessoas melhores".
O presidente do TRE, então, lembra aos presentes que o atual governador de Pernambuco venceu de maneira contundente as eleições na seção instalada ali. "Isso significa que vocês acreditam nele. Então, cobrem dele. Se estiverem insatisfeitos com alguma coisa, escrevam uma carta e mandem entregar a ele. Exerçam a cidadania".
O Eleitor do Futuro é um programa que busca estimular a consciência política dos jovens através de palestras e atividades lúdicas, como peças teatrais e dança. Durante todo o ano, a EJE promove vários encontros em todas as regiões de Pernambuco. Na gestão do presidente Luiz Carlos Figueirêdo, conforme lembra o desembargador eleitoral substituto e diretor da EJE, Delmiro Campos, a Escola foi "desafiada" a levar o programa também para as unidades da Funase. E assim foi feito.
Para tal, o TRE contou com a parceria indispensável do secretário estadual de Desenvolvimento Social, Criança e Juventude, Cloves Benevides, e da presidente da Funase, Nadja Alencar. No evento da última quinta-feira, ambos falaram aos jovens e fizeram questão de transmitir mensagens de esperança. Uma esperança que era renovada, em forma de música, a cada acorde da Banda Liberdade, composta por 12 adolescentes do Centro de Atendimento Socioeducativo (Case) de Abreu e Lima.
Mostrando-se politizados e conscientes, os jovens da Funase do Cabo aproveitaram o momento para fazer uma apresentação de um RAP que enaltece os avanços trazidos pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Em rimas contundentes e por vezes cortantes, falam da falta de oportunidades, da importância da família, do perdão. Logo, o ritmo volta a mudar. Outros jovens vão ao microfone e cantam os versos melodiosos de "É preciso saber viver", de Erasmo Carlos e Roberto Carlos, e "Tempo perdido", da Legião Urbana.
Aos poucos, a emoção vai ganhando espaço. É quando um ex-socioeducando, de terno e gravata, canta um louvor relatando o desespero que sentia quando estava privado da liberdade. Outros egressos contam sua história e dão um recado aos socioeducandos ali presentes: "Sei que é difícil. Mas se eu saí e hoje estou bem, vocês também podem conseguir".
Visivelmente emocionado, Delmiro Campos vai ao microfone e também fala aos jovens. Mostra que a vida é feita de ciclos. Para tudo e para todos. E, assim como o presidente Luiz Carlos Figueirêdo, estimula a plateia a, pacificamente, sempre lutar pelos seus direitos. "Paz sem voz não é paz. É medo", diz o diretor da EJE, citando uma das canções de O Rappa. Os desembargadores do TRE-PE Agenor Ferreira de Lima Filho (vice-presidente do Tribunal) e Stênio Neiva, bem como os juízes Flávio Fontes e Roberto Jordão e a diretora-geral Isabela Landim também estiveram presentes.
Para fazer jus ao nome do programa Eleitor do Futuro, que tem o complemento Exemplos de Superação, não poderia dispensar histórias edificantes de pessoas que superaram as dificuldades impostas pela vida. Álvaro Pastor, servidor do TRE-PE, contou sua infância de dificuldades, o esforço de sua mãe para manter os filhos alimentados e no caminho da retidão. Hoje, Álvaro é chefe de cartório e, aprovado em concursos públicos, aguarda ser chamado para a magistratura ou Ministério Público.
O final do evento trouxe uma esperança festiva e, ainda que remotamente, lembrou as edições do Eleitor do Futuro nas escolas, quando as palestras são direcionadas a jovens livres. Convidado pelo servidor e amigo Jeovane Ramos, também da EJE, o poeta e cantador Petrúcio Amorim conversou com os socioeducandos, revelou sua vida de dificuldades em Caruaru, mostrou que soube superar os obstáculos estando sempre do lado do bem e cantou seu clássico, Tareco e Mariola. Uma síntese de sua vida.
Quando o presidente do TRE encerrou oficialmente o evento citando agora os versos do compositor Flávio José ("pode ser o país de quem quiser, mas não é, com certeza, o meu país"), a tensão do início dava espaço a pequenas manifestações de satisfação. Nada muito efusivo, é verdade. Mas um bom observador percebe que uma semente foi plantada ali, naquela manhã de quinta-feira. A história foi feita.